Recentemente o Ministério da Saúde envolveu-se em uma grande cruzada contra a Rubéola. A Rubéola, segundo o site Wikipédia, é uma doença infecciosa causada por vírus. Embora seja considerada por alguns médicos como uma doença infantil, ela pode ser contraída em qualquer idade. É potencialmente perigosa para mulheres grávidas, principalmente, nos primeiros três meses da gravidez, podendo causar má formação do feto. A estratégia de contaminação pelo vírus é extremamente eficiente: pelo ar, através de secreções da pessoa infectada; contato direto; pelo sangue, no caso dos fetos. A forma mais eficiente de combatê-la é através da imunização.
Por isso, os esforços do Ministério da Saúde para vacinar o maior número de pessoas possível, dentro da faixa de idade considerada fértil, imunizando-as contra os ataques desses seres microscópicos.
A melhor arma contra doenças viróticas ainda é a prevenção, através das vacinas. Tendo em vista, que ainda não conseguimos produzir drogas que destruam efetivamente os vírus. Está tudo a cargo do corpo que, ao ser contaminado, identifica o tipo de invasor e logo começa a combatê-lo da forma como pode. Os cientistas, sabendo dessa reação do organismo sobre os corpos estranhos, tentam isolar o agente invasor e estudar sua estrutura e ação. Com este conhecimento, abrandam as atividades ou matam os invasores utilizando-se de outros seres resistentes a eles. Os vírus mortos ou apenas debilitados são injetados no organismo para ativar-lhe as defesas. Neste processo, há um aumento considerável dos fagócitos, células que absorverão ou, literalmente, devorarão os corpos invasores. Caso a pessoa contamine-se com aquele tipo de vírus, posteriormente, as defesas já estarão a postos, impedindo a reprodução e proliferação desses seres patogênicos, isolando-os e até matando-os.
Hoje sabemos de tudo o que foi exposto acima, e, estamos mais “abertos” aos avanços da ciência e aos cuidados com o corpo – tenha-se em mente que por inúmeras vezes, no escoar do século XX, vimos doenças terríveis debeladas pelos estudos e produtos científicos. Normalmente, os governos, com base nos conhecimentos científicos, impunham às populações a vacinação
José Murilo de Carvalho, preclaro historiador e membro da Academia Brasileira de Letras, dedica em sua obra “Os bestializados” um capítulo sobre esse movimento popular ocorrido em 1904, no Rio de Janeiro. A princípio, havia um grande descontentamento com a política econômica financeira, adotada pelos presidentes da República Velha até a data tratada. Os vícios que imperavam desde a infância da República no Brasil, herdados do antigo regime, a interdição de moradias e cômodos comerciais considerados insalubres e anti-higiênicos contribuíram para instigar a revolta contra o governo. Até mesmo um desejo dissimulado de um retorno ao Estado monárquico, desponta entre os motivos. Pelo que indica o autor, uma miríade de sentimentos povoavam a mente dos cidadãos brasileiros do final do século XIX e início do século XX.
Prosseguindo com suas pesquisas, o nobre historiador narra os fatos e procura compreender seus significados; resumidamente, a conhecida Revolta da Vacina era contra a obrigatoriedade da vacinação contra a Varíola. Ocorrida em 1904, no Rio de Janeiro – foi a terceira epidemia no alvo das ações tomadas na área da saúde por Oswaldo Cruz – revelou-nos uma profusão de idéias e valores acatados pelas classes sociais do dito período.
Entre argumentos e ponderações, José Murílio de Carvalho acaba por demonstrar o caleidoscópio de expectativas da época que desencadeou a revolta.
Para ele, os motivos ideológicos parecem suficientes, embora não sejam os únicos motivos da dimensão e profundidade da Revolta. Diferentemente de outros conflitos de proporções semelhantes, para o ilustre historiador, as razões ideológicas e morais estavam na justificação do movimento. É bem verdade, continua ele, que razões ideológicas e morais são, algumas vezes, detectadas mesmo em Revoltas de ordem econômica.
Todavia, na Revolta da Vacina, predomina o que ele chama de “fusão ideológica”: uma fusão de valores oriundos da mentalidade da elite e das classes burguesas com valores populares.
Considerando os interesses de classes, José Murilo de Carvalho escreve que naquele momento compatibilizavam-se os interesses contra as imposições do governo; pois, ambos convergiam para oposição à interferência do governo além dos limites aceitáveis.
Limites aceitáveis para ambas as classes correspondiam: para as elites, aos princípios liberais, um governo não intervencionista e em defesa das liberdades individuais. Para o povo, os valores ameaçados eram: a virtude da mulher e esposa e a inviolabilidade do lar.
Mais detalhadamente, as elites defendiam a não intervenção do Estado – anteriormente idealizado e implantado com a proclamação da República – nos negócios particulares; e, buscavam resguardar esses valores e fazer prevalecer as liberdades individuais. O povo, por sua vez, defendia a inviolabilidade do seio familiar. Alegavam as classes populares, que o ato de penetrarem nos lares na ausência dos maridos obrigando as suas esposas e filhas ao desnudamento dos braços, parecia-lhes um sacrilégio. Este pensamento beirava a imoralidade e violação do último santuário ainda não maculado pelo Estado.
Consideramos, em vista da análise de Sérgio Murilo de Carvalho, que a mentalidade apresenta-se amplamente volátil no escoar dos anos. Adaptando-se às idéias das elites dominantes que tentam de toda maneira estar à frente e preservar o seu Status Quo. Uma ação considerada autoritária, por parte do governo da época, colocou lado a lado a elite e povo animados por questões éticas e morais, tendo como pano de fundo uma forte crise financeira. Hoje, provavelmente, a Revolta se daria de ponta-cabeça ou seria a Contra-Revolta da Vacina. Brigaríamos pela intervenção efetiva do governo, na obrigatoriedade e no fornecimento do medicamento.
Relativo aos acontecimentos narrados, ainda não descobrimos, através de nossas pesquisas nos documentos do acervo, nenhuma referência ou menção à Revolta em Pará de Minas, na época chamada: Cidade do Pará. Por enquanto, não sabemos se houve repercussão, em nossa cidade, da grave crise social que assolou o Rio de Janeiro, no ano de 1904. Podemos, contudo, supor, levando-se em consideração outros fatos, que Pará de Minas sendo uma cidade pacífica, defensora da ordem e, apesar do difícil contexto econômico vivido na época, não se oporia às ordens do Estado. Mas, sem uma documentação para basearmo-nos, é somente especulação.
(*)Imagem retirada do livro: CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.
Publicado na coluna Resgate Histórico do Projeto Acervo Documental Mesopotâmia Mineira em 15/12/2008, no Jornal Diário
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