Um excerto de uma das obras de Marcel Proust, traz à luz, em uma reflexão cotidiana, a máxima do pensamento Cartesiano:
(...) de modo que cada novo encontro é uma espécie de reafirmação que nos traz de volta ao que muito bem tínhamos visto. Mas já não nos lembrávamos, porque o que chamamos recordar uma criatura é na realidade esquecê-la. Enquanto ainda sabemos ver, no momento em que nos aparece o traço esquecido, nós o reconhecemos e temos de retificar a linha desviada, e vinha daí que, na perpétua e fecunda pela qual me eram tão saudáveis e suaves aqueles cotidianos encontros com as moças à beira-mar, entrassem em partes iguais as descobertas e as reminiscências.(...) Toda criatura se destrói quando deixamos de vê-la; seu aparecimento seguinte é uma criação nova, diversa da imediatamente anterior, se não de todas.(...) No confronto de nossa recordação com a realidade nova, é isso que há de marcar nossa decepção ou surpresa, e se nos afigura um retoque da realidade, avisando-nos de que havíamos recordado mal. E por sua vez esse aspecto do rosto, anteriormente desdenhado, e justamente por isso mais sedutor agora, mais real e significativo, se converterá em matéria de sonhos e recordações.(...).
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Marcel Proust. Em busca do tempo perdido: À sombra das raparigas em flor. Volume 2. pp. 578,579.
(*) Ilustração: imagem atribuída a René Descartes. disponível : http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/73/Frans_Hals_-_Portret_van_Ren%C3%A9_Descartes.jpg
02/04/2010 13:11hs.
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