Joandre Oliveira Melo
Machado de Assis(1839-1908), o Goethe brasileiro, foi um homem que até hoje enche nossos corações de orgulho por sermos brasileiros. O homem foi-se com o tempo, porém sua idéia, sua sensibilidade e aguda percepção do mundo e dos porões do Ser Humano, permanecem e permanecerão por muitos séculos. Ainda que, sejamos destituídos de nossa humanidade, com a crescente (des)umanização do Homem e sua transformação em apenas uma ranhura na incessante engrenagem do mercado, pervetendo os desejos mais simples e naturais da natureza humana, porpondo-lhe a sofisticação de suas necessidades.
O poder midiático corrompendo a áurea era româtica cultivada pelo autor, substituindo-a por um estilo de vida onde primam os desejos individuais. O erotismo exacerbado como forma satisfação pessoal, de liberação da mulher e de auto-afirmação do homem. Ou, por outro lado, a vulgarização da relação genital homem-mulher. A depreciação da imagem da mulher rebaixando-a a apenas objetos sexuais ou a "cachorras".
A substituição do companherismo e da cumplicidade, pela parceria. A racionalização desmitificadora dos relacionamentos inaguram uma nova ética: a barganha. Contra esse estado de coisas Machado de Assis, em sua obra, Memorial de Aires, evoca a memória de sua amada, carolina, como Dante antes o fizera com sua musa Beatriz, como a "liga" capaz de "cimentar" a alma do homem que parece de pedras soltas:
Queriam-se, sempre se quiseram muito, apesar dos ciúmes que tinham um do outro, ou por isso mesmo. (...) os tempos amargos em que, ajustado o casamento, perdeu o emprego. (... e) teve de procurar outro; a demora não foi grande, mas o novo lugar não lhe permitiu casar logo (...) Ora, a alma dele era de pedras soltas; a fortaleza da noiva foi o cimento e a cal que as uniram naqueles dias de crise. (Machado de Assis apud José Sarney, p. A2: 2008)
Pelas palavras acima, Machado de Assis transmite-nos a força do amor daqueles dias; o noivo, simboliza o homem - baseado nele próprio - e a noiva, a fortaleza do noivo, sua cúmplice e companheira, suporte nas horas difíceis, lenitivo nos dias de crise,conforto da alma do Homem, argamassa que funde sua alma - figura eternizada de Carolina, sua amada.
Após as belas palavras, tão bem selecionadas do texto de Machado de Assis pelo ilustre sr. José Sarney, resgatam de nossa alma a silhueta do amor daquela época, arrancada da intimidade do homem oitocentista.
Parece-nos um sentimento tão nobre que dá vontade de sentí-lo novamente, de resgater aqueles dias de romantismo e profundos sentimentos, enquanto somos dilacerados pela indiferença e individualismo da modernidade, testemunhas de tragédias cruéis, movidas por sentimentos tão mórbidos como o sequestro e morte da garota Eloá, em São Paulo.
ao mesmo tempo que escrevo esse texto, desejo relembrar a passagem deste grande homem que um dia viveu entre nós. O que não daríamos para que todos pudessem ler e entender Machado de Assis.
_____________________
Referências
SARNEY, José. Machado e Carolina. artigo publicado na Folha de S. Paulo, seção Opinião, de 24 de outubro de 2008. São Paulo: Folha de S. Paulo - 2008. p. A2.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Agradeço pelo seu comentário.