terça-feira, 13 de novembro de 2007

A cordialidade e os políticos brasileiros

Sinópse: O texto abaixo é uma análise da atual situação política que estamos vivendo no Brasil. O enfoque é histórico e busca compreender o atual estado de coisas. Baseado nos textos de Júnia Furtado e Sérgio Buarque de Holanda.

Por Joandre Oliveira Melo

O festival de escândalos que assola o país, nos deixa muito tristes e descrentes com o futuro desta que poderia ser a maior nação do mundo. Cabeças pensantes e idéias não nos faltam. O que falta é direcionarmos nossa vontade de um modo mais racional e menos egoísta. O desejo de fazer, de realizar para o outro e não somente para si ou para seus afins.

Essa situação leva-nos a repensar o país. De onde vem essa cultura de somente querer para si, esta condição anômala e depravada do pensamento humano de somente ter, e quanto mais se tem mais se quer ter? Bom, gostaria de apresentar-lhes uma visão que não é a única e também não é a verdadeira, mas, uma visão para refletir.

Devemos voltar aos fins da Idade Média. Lá encontra-se “o germe” da doença que nos acomete. Neste período, fins do século XIII aproximadamente, há uma intensa produção material, um grande avanço técnico e os homens começam a redescobrir-se como seres autores deste mundo – ressurge o comércio. De lá para cá o comércio evoluiu, muitas lutas foram travadas e as populações se modernizaram, uma nova ordem mundial emergiu: o capitalismo. E dentro desta nova ordem, um estado, especificamente: Portugal.

Como todos sabem, em 1500, eles chegaram ao Brasil. A primeira visão que tiveram das terras de “Santa Cruz”, era que haviam encontrado o paraíso terrestre. E devia ser mesmo – Já pensaram como seria naquela época um rio como o São Francisco, com seu imenso volume de límpidas e translúcidas águas – Mas, essa é uma outra história. Desde aquela época a visão do paraíso se modificou ou pelo menos para a maioria dos trabalhadores que desbravou essa Terra e a fez produzir, sob o mando dos aventureiros que se enriqueceram. Controlando tudo, estavam os portugueses, aventureiros, com seus costumes e tradições herdados dos seus antepassados medievais. A máquina Portuguesa introduziu empreendimentos aqui no Brasil, à sua moda é claro. Mas qual era essa maneira de administrar?

Os portugueses, em número reduzido em comparação à imensidão de terras que teriam de controlar, lançam mão de um recurso muito comum aos homens, principalmente naquela época, século XVI, escravizar os negros da África. Assim obtiveram os trabalhadores. Mas, alguém deveria guiá-los; tudo começa aqui. Nobres e empreendedores, aventureiros, recebem doações de terra de Portugal para gerirem. Até aqui tudo bem, era a prática normal do capitalismo, principalmente na época. O problema é que essa classe cresceu e prosperou, e para mantê-la sob sua tutela, Portugal assumiu uma atitude de extrema cordialidade e de boa vontade para com os interesses dessa classe, apesar dos conflitos.

De acordo com Júnia Furtado, uma dependência entre as elites locais (aventureiros) e Portugal (Metrópole) marcava o contexto de uma complexa relação. Relação de “cordialidade” de uma classe para com a outra.. A elite local adquiriu grande poder e isso fazia com que os ricos daquela época estendessem os “quintais” de suas casas. Havia assim, uma maliciosa união do público (as terras, as pessoas, a produção, os edifícios públicos) - com o privado. O poder político delegado por Portugal para as elites e em troca o controle local por essa classe, era a espinha dorsal do sistema administrativo que se instalou no Brasil: Onde um Ouvidor, ou o fazendeiro, era a lei e o que era público era também deles. Portanto, não era nada surrupiar um pouco das riquezas públicas para mover seus empreendimentos Esses ricos homens que também eram os políticos. A riqueza imperava como meio de ascensão política.

Resgatando um pouco de nossa história com base em historiadores como Júnia Furtado, Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prado Jr, podemos perceber que esse sistema não mudou muito. Essas relações pessoais que outrora existiram, ainda parecem estar acontecendo em nossos dias. Isso interfere em nossas relações e vemos um festival de escândalos onde a coisa pública é repartida entre aqueles “Barões” da política. Este comportamento está de tal forma internalizado na nossa cultura, no nosso “jeitinho brasileiro”, na troca de favores, que nem nos damos conta de que o dinheiro público é do povo, sendo assim, é para ele que se deve usa-lo.

Para tentarmos entender o atual modelo; dentro de uma visão, a qual não é a única e nem tem a pretensão de ser a verdade, apenas uma forma de ver, voltamo-nos ao passado e revivemos, mesmo que rápida e resumidamente, as atitudes de nossos ancestrais. Assim é a história, para entendermos o presente buscamos as causas no passado. Contudo, a história é dinâmica e os homens a constróem continuamente. Agarrando-me a esse “devir” dos acontecimentos renovo minhas esperanças de que dias melhores virão.

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Referências Bibliográficas:

FURTADO, Junia. O outro lado da Incofidência Mineira: Pacto Colonial e Elites Locais. In.: LPH: Revista de História, nº4 1993/1994.

HOLANDA, Sérgio Buarque. O Homem Cordial. In.: Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

Texto publicado no Jornal Diário de Pará de Minas em 03/03/2006.

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