segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Brasil: e o arroz com feijão

Na semana passada, o comitê de política monetária do Banco Central (COPOM), baixou, em 0.25 ponto percentual -- a taxa já estava em 7,5%, a mais baixa das últimas décadas --, a taxa SELIC (Sistema Especial de Liquidação e Custódia), criada em 1979. Esta taxa baliza todas as taxas de juros cobradas nas operações financeiras no país, logo, oferece, ao governo um bom dispositivo antiinflacionário. Destarte, aumentando-se a taxa de juros da SELIC o crédito fica mais custoso com juros mais altos. A tendência do consumo e dos investimentos neste cenário é, obviamente, reduzir-se forçadamente. Por Outro lado, baixando-se a taxa SELIC os juros dos empréstimos ficam mais baratos e mais acessível aos empresários. O crédito para investimentos também é atingido, pois, os custos dos empréstimos estarão mais baixos. Existe ainda, aquele tabu: em épocas de juros altos prevalece a velha ideia de vender algo aplicar e viver de rendas. Juros mais baratos, significam, no final, abundância de crédito para os empresários investirem em suas empresas e crescerem; os consumidores por sua vez são incentivados a desembolsar suas poupanças ou tomar dinheiro emprestados para adquirirem os produtos dos seus sonhos. Os parcelamentos multiplicam-se. É como uma reação em cadeia. É o que espera a área econômica do governo: incentivar o consumo ou mantê-lo e o investimento para que a famigerada roda do capitalismo não pare. Até agora as medidas tomadas pelo governo para proteger o Brasil da crise da economia mundial tem dado  resultado.
É fato, contudo, que em toda decisão existe sempre algo de colateral. A queda da taxa Selic -- que é o índice que as instituições financeiras seguem para guiar suas taxas de juros --, por exemplo, barateou o custo do crédito. Todavia, uma fuga de dólares de especuladores, investimento "podre" -- pois, só querem lucrar e não dar nada em troca -- , pressionou a alta do dólar.
A alta do dólar não seria um mal em si, considerando que os dólares que evadiram não trariam nada em retorno. Além disso, desestimula a importação e estimula a exportação, isso é bom, pois, ajuda a equilibrar nossa balança comercial. Por outro lado, existe um agravante; muitas empresas nacionais têm dívidas em dólar -- com fornecedores, matéria prima, empréstimos, entre outros --, neste caso, é um problema, pois, encarecem o produto final destas empresas que perdem competitividade no mercado externo. A perda de competividade leva a empresa a uma crise financeira e o resultado todos nós conhecemos bem: demissão. Para equilibrar o descompasso da fuga de dólares, o Banco Central é obrigado a despejar dólares, das suas reservas, no mercado no intento de conter o preço da moeda dólar em patamares não nocivos à economia. Manter essa política de controle cambial também tem seus efeitos colaterais, entretanto, não trataremos neste momento.
A peleja do EUA para baixar sua taxa de desemprego e reduzir o déficit, falta de crédito, alta do dólar, crise na Europa e contração das aquisições de commodities pela China, grande compradora. Todos estes problemas vão de encontro com os interesses das empresas mineradoras e do ramo petrolífero. Com custos altos, queda sensível no preço do minério de ferro, praticamente imposto pela China ao mercado internacional, empresas como a Vale amargam prejuízos em relação ao mesmo período do ano anterior. A tonelada de minério que chegou a valer U$ 150.00, chegou a semanas atrás ao patamar de U$ 90.00.
algo parecido acontece com a Petrobrás que tem dívidas a saldar em dólares. O preço dos combustíveis estão sob o controle do governo. Com o prejuízo apresentado pela Petrobrás, o primeiro em treze anos, conforme a Folha de S.Paulo, alguns políticos e a presidente desta companhia cogitam pressionar o governo a conceder um aumento dos preços dos hidrocarbonetos. O aumento deste insumo fundamental para mover as indústrias modernas, não é bem visto pelo governo que tenta a todo custo -- baixando a taxa Selic, baixando IPI de alguns produtos --, manter a inflação sob controle, investimentos e facilidade de crédito fomentando o consumo. Todos os esforços para manter a economia girando e um incremento do Produto Interno Bruto que não deve passar de dois porcento, segundo analistas da Folha de S.Paulo.
Outro efeito colateral da queda da taxa Selic é que estimula uma fuga de capitais das aplicações financeiras para outras com regras mais engessadas e garantia maior do governo, como é o caso das cadernetas de poupança que veem apresentando uma ligeira lucratividade em relação às outras aplicações no mercado financeiro. Como as regras da poupança definem claramente sobre o uso do dinheiro aplicado o governo não tem como captar recursos no mercado para quitar seus débitos e socorrer o mercado para impulsionar o investimento e o emprego. Logo, pensa-se em reduzir os rendimentos da caderneta de poupança quando a taxa Selic cair a menos de 7,5%. Isto não seria um grande problema, pois, incentivaria um consumo reprimido, já que a ordem do dia é "comprar". Mas, não é o que parece acontecer; a resposta, talvez seja que as famílias estão endividadas demais para aumentarem seu consumo e os empresários estão desconfiados demais para investir em seus negócios sem a certeza de vendas garantidas.
Segundo a economista Mônica Baumgarten, as famílias estão endividadas o bastante e utilizam a queda dos juros e a situação privilegiada de "pleno emprego", que ainda persiste, para amortizar suas dívidas.
Bem, por enquanto a situação é razoavelmente boa para o Brasil, embora não vejamos um aumento expressivo do PIB para este ano, e a indústria não reage e tende a demitir. O setor de serviços, por enquanto, absorve esta oferta por que cresce mais rápido. É preciso, no entanto, identificar se ser um país com um setor de serviços extremamente desenvolvido é uma condição boa. Ainda não parece ser a "vocação" do Brasil.
Segundo a economista Mônica Baumgarten a vocação do Brasil que poderia ser explorada sem mais traumas seria o agronegócio.
O agronegócio é uma atividade forte no Brasil -- vastidão territorial, extensas bacias hidrográficas e clima diversificado --, que corrobora para esta atividade. Porém, esbarramos em um sério problema: infraestrutura. A péssima condição da infraestrutura -- como meios de financiamento, armazenagem e escoamento da produção --, devido a deplorável situação que encontra-se nossa malha rodoviária. Junte-se a falta de investimento em meios de transportes mais econômicos e menos dependentes de hidrocarbonetos, enfim. Como escolhemos como meio principal de transporte o rodoviário de custo mais elevado, mais poluente e, ainda, às voltas com um possível aumento do preços dos combustíveis (ver situação difícil da Petrobrás). Chega-se fácil a uma conclusão: como produzir e desaguar os produtos com rapidez, qualidade e a custos competitivos no mercado internacional, onde digladiam-se vários Estados com grande poder de competição, à procura de seu espaço vital?
São muitos os problemas; a somatização deles apresenta-se como desafios aos economistas e políticos sérios que pensam em fazer o país crescer e não sucumbir à crise econômica mundial.
Pessoalmente acredito que países que têm sua atividade exportadora amplamente baseada em comodities têm sérios problemas para impor seus preços. Pois, para impor preços seria necessário que o país adquirisse o monopólio de tal comoditie, o que, em tempos atuais é bastante difícil devida a disseminação de técnicas e tecnologia que dá suporte um aumento extraordinário das forças produtivas além de difundirem largamente o conhecimento no mercado. Por um lado esse avanço tecnológico provocou uma revolução no conhecimento regional rompendo barreiras, por outro lado, países menos desenvolvidos que vivem da produção de comodities ou matéria-prima para outros tornaram-se reféns da imposição das nações desenvolvidas e melhor aparelhadas tecnologicamente. Outra dúvida é se vale a pena fornecer a matéria-prima para que outros países a modifique, benefie e revenda o produto acabado aos países fornecedores de matéria-prima. Trata-se veladamente de um sistema colonialista. Vejamos, se pudéssemos voltar a produzir café em quantidade suficiente e, se, estivemos sós nessa empreitada, sem competição, como em tempos do século XIX, tornaríamos uma empresa produtora e exportadora da comoditie (café); continuemos no campo da imaginação, pensemos que pudéssemos atender a incrivel demanda mundial. Poderíamos, neste cenário, impor nosso preço e assim fortalecer nossa economia. Ainda nesta linha de raciocínio, esta especialização tomaria terra produtivas em outras atividades para suprir o mercado externo e todos os esforços se voltariam para esta atividade que atingiria índices extremamente lucrativos. Porém, é uma prosperidade fugaz, pois, logo que tivéssemos competidores no mercado tudo ruiria, como aconteceu na década de 1930. Logo, diversificar os produtos, agregando-lhes valor, reduzindo os custos de produção, logística e impostos, no atual modelo parece mais prudente.
O raciocínio vale para prestação de serviços, que é uma atividade mais vulnerável do que a cultura de café. A assimilação do conhecimento por nações desenvolvidas acontece em velocidade exponencial em relação à nossa capacidade que cresce aritmeticamente em relação ao setor de serviços. Temos uma escola que não forma, uma educação precária, e, acima de tudo não há um desejo em formarmos doutores, mestres ou especialistas, pois, a crise europeia tornou estes especialistas dispensáveis em seus países, e como já estão formados e possuem especialização e competência atendem as demandas dos países subdesenvolvidos por preços menores. Aliando-se assim a falta de vontade de reformar nosso setor educacional e formador de especialistas ao baixo custo dos profissionais altamente capacitados que entram e ocupam cargos de liderança em grandes empresas brasileiras que poderiam ser supridas por profissionais brasileiros.
O incentivo a determinados seguimentos da indústria, como ocrorre atualmente com a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), sobre veículos automotores é algo um tanto temeroso. Veja bem, se não temos uma boa infraestrutura para escoar a nossa produção e o meio de transporte é basicamente o rodoviário, o incremento do número de veículos circulando nestas vias, desfasadas, mal conservadas, será um complicador. Além disso é preciso avaliar os acordos com entidades internacionais sobre o aumento da emissão de carbono e gases tóxicos para a atmosfera.
Finalmente encerro com uma pergunta. É mister que teremos que incentivar nossa indústria, protegê-la da competição desleal do mercado externo dando-lhe condições de reduzirem custos, reduzindo primeiramente o peso dos impostos, melhora na infraestrutura e fornecimento de crédito para renovação do parque de máquinas em formação profissional de seus empregados. Algo mais é necessário, precisamos fomentar a produção de produtos acabados, para não dependermos apenas das comodities. A questão impõe-se: será que teremos tempo para mudarmos tão radicalmente neste período de crise mundial ou devemos atender nossa vocação, como quer a nobre economista Mônica Baumgarten de Bolle e investir pesado no Agronegócio?
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Referências:
Baseado em entrevista à Folha de S. Paulo, 25 de agosto de 2012. Brasil deveria assumir vocação para agroindustria. Mercado B5.disponível em 29.10.2012 23:55.

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