domingo, 9 de novembro de 2014

Apelo por um Mundo Novo

Senhores,


Nenhum de nós conheceu ou conhece sequer o que é socialismo, muito menos o comunismo. O que vimos com vitória bolchevique na Revolução de 1917 e com a extinta União Soviética foi um levante apressado e desmedido de forças idealistas de esquerda que julgaram equivocadamente (grifo meu) que o vigor capitalista exaurira-se; empolgados pelas insistentes crises que assolavam o mundo entre o fulgor e a miséria, submetendo uma legião de seres humanos principalmente mulheres, crianças, velhos e pobres que trabalhavam viviam e morriam sob a ordem da acumulação capitalista. Todos sabem que o sistema capitalista experimenta momentos de esplendor e de extrema miséria, as contradições são irreconciliáveis.



Ninguém pode negar que tudo que nos foi legado e proporciona nosso prazer -- a inebriante força tomada da natureza e modificada pela capacidade "pensante" ou não "pensante" do ser humano para fazer frente ao vazio da existência -- é uma construção contínua e coletiva. Podemos afirmar que existe uma modalidade de trabalho objetivado em tudo, posto como resultado de mãos e mentes que hoje não estão entre nós, mas suas realizações ainda permanecem atendendo nossas necessidades ou, até mesmo, nossas futilidades, como base para que outros pudessem erguer suas teorias, construir suas fortunas, enfim, basear todo o modo de vida que vemos hoje. E, por conseguinte, nós legaremos aos nossos descendentes algo como os artesãos do passado no legaram. O continum permanece na produção coletiva. O que acontece é que essa produção coletiva antes de pertencer ao grupo pertence ao capitalista "dono" dos meios de produção. Grifo "dono", pois esta é uma questão bastante subjetiva e que não conseguiria explorá-la aqui.



Sabemos, aceitando ou não, que o homem é egoísta e vive em um mutualismo simbiótico com tal vício manipulando-o e sendo manipulado por ele.



Saibam todos que os corruptos e genocidas arrestados ou não, agiram conforme sua mentalidade egoísta. Legitimando suas ações através do sistema repressor da força ou, pior, da submissão consentida de tantos homens, semelhantes seus. Tudo em busca do prazer, sob os auspícios da ideia de "progresso e ordem".



Como poderíamos condenar alguns corruptos e genocidas -- sendo que os tribunais da história estão cheios deles? Nós, todos sem exceção, temos as mãos sujas de sangue.



Tentarei explicar-me sobre o flagelo da humanidade exposto aqui em corrupção e genocídio. Tomarei emprestado da história, por exemplo, os castigos impostos aos homens, por outros que nada fazem a não ser parasitar o trabalho dos seus semelhantes e viver em ostentação. São tantos exemplos, nos últimos milênios, que os atuais corruptos e genocidas não passam de meros aprendizes diante da abundância de narrativas históricas.



No livro O Capital de Karl Marx, livro I, volume I, já nos bastaria para exemplificar alguns:



"(...)Para muitos fabricantes, o lucro extra a ser obtido com o sobretrabalho além do tempo legalmente e estabelecido parece ser uma tentação grande demais para que possam resistir a ela. Eles consideram a probabilidade de serem descobertos e calculam que, mesmo que sejam apanhados, o pequeno valor das multas e dos custos judiciais ainda lhes garante uma boa margem de ganho."



À página 320, lemos: "No último inverno (1862), 6 das 19 moças foram dispensadas em decorrência de doenças provocadas por excesso de trabalho. Para mantê-las acordadas, tenho de gritar em seus ouvidos. (...)as 'crianças' estavam tão cansadas que não podiam manter seus olhos abertos durante o trabalho; na verdade nós mesmos quase não o conseguimos. (...) Tenho 13 anos (...) Durante o inverno passado [anteriormente a 1862], trabalhamos até as 9 horas da noite [sob o rigoroso inverno Londrino]. No último inverno, quase todas as noites eu costumava gritar de dor em meus pés machucados. (...)Quando este meu filho tinha sete anos de idade, eu costumava carregá-lo nas costas para toda parte, atravessando a neve e ele costumava trabalhar 16 horas por dia! (...) frequentemente eu tinha que ajoelhar-me para alimentá-lo, enquanto ele permanecia junto à máquina, pois não lhe era permitido abandoná-la ou pará-la." Smith, sócio-diretor de uma fábrica em Manchester se gabava "(...) raramente 'paramos' antes das 6 horas da tarde. (...) Na realidade trabalhamos além da jornada normal durante todo o ano (...) tanto crianças quanto adultos (...) trabalhamos igualmente em média, durante os últimos 18 meses um mínimo de 7 jornadas e 5 horas na semana ou [extenuantes] 78,5 horas semanais. Nas 6 semanas que se completam em 2 de maio deste ano (1863) a média foi maior: 8 jornadas ou 84 horas na semana!"



As narrativas são excertos do livro "O Capital" de Karl Marx, editora BoiTempo 2013, tradução direta do Alemão, páginas 315 a 320. Há nesta obra uma narrativa que coraria o rosto do mais cínico dos homens. Mr. Broughton Conty Magistrate declara: "(...) crianças entre 9 e 10 anos de idade são arrancadas de suas camas imundas às 2, 3, 4 horas da manhã e forçadas a trabalhar, para sua mera subsistência, até as 10, 11, 12 horas da noite, enquanto seus membros se atrofiam seus corpos definham, suas faces desbotam e sua essência humana se enrijece inteiramente num torpor pétreo, cuja mera visão já é algo terrível.(...)". Senhores, já que cito algo de um tempo imemorável, gostaria de relembrar que toda a produção do homem é inexpugnavelmente de natureza coletiva e continua e, se hoje, temos a nosso dispor todas as maravilhas que o capitalismo nos proporciona, significa que temos as mãos sujas com o sangue de nossos antepassados destroçados pelas famigeradas engrenagens do sistema capitalista. No Brasil, as coisas não correram muito diferentes é público o caso da escravidão e do trabalho servil em todo o território.



Há aqueles que inclinam-se para a volta de um poder militar que conclame através da força toda a sociedade a julgar seus corruptos e genocidas. Para lembrar-nos sobre o período negro que as forças repressoras de um Estado de direita nos impôs, utilizando-se dos mesmos ardis, transcrevo abaixo os inesquecíveis Atos Institucionais, uma pequena amostra do que poderemos enfrentar: (Disponível em: http://www4.planalto.gov.br/legislacao/legislacao-historica/atos-institucionais, 09.11.2014 19:20.)



Atos Institucionais
Normas elaboradas no período de 1964 a 1969, durante o regime militar. Foram editadas pelos Comandantes-em-Chefe do Exército, da Marinha e da Aeronáutica ou pelo Presidente da República, com o respaldo do Conselho de Segurança Nacional. Esses atos não estão mais em vigor.
Ato
Resumo do conteúdo
(elaborado pelo Centro de Estudos)
Autoriza o Presidente da República a transferir para reserva, por período determinado, os militares que hajam atentado ou venham a atentar contra a coesão das Fôrças Armadas.
Declara vacância dos cargos de Presidente e Vice-Presidente da República; dispõe sobre eleições e período de mandato para esses cargos; confere a Chefia do Poder Executivo aos Ministros militares enquanto durar a vacância; exclui da apreciação judicial atos praticados de acordo com suas normas e Atos Complementares decorrentes; e dá outras providências
Dá nova redação ao artigo 1º do Ato Institucional nº 11, de 14 de agosto de 1969, que dispõe sobre as eleições para Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores dos Municípios; exclui da apreciação judicial atos praticados de acordo com suas normas e Atos Complementares decorrentes.
Dá nova redação ao artigo 15, §11 da Constituição Federal de 1967; garante a vigência de Atos Institucionais, Atos Complementares, leis, decretos-leis, decretos e regulamentos que dispõem sobre o confisco de bens em casos de enriquecimento ilícito; exclui da apreciação judicial atos praticados de acordo com suas normas e Atos Complementares decorrentes.
Dispõe sobre o banimento do território nacional de brasileiro inconveniente, nocivo ou perigoso à segurança nacional, mediante proposta dos Ministros de Estado da Justiça, da Marinha de Guerra, do Exército ou da Aeronáutica Militar; exclui da apreciação judicial atos praticados de acordo com suas normas e Atos Complementares decorrentes.
Confere aos Ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar as funções exercidas pelo Presidente da República, Marechal Arthur da Costa e Silva, enquanto durar sua enfermidade; exclui da apreciação judicial atos praticados de acordo com suas normas e Atos Complementares decorrentes.
Dispõe sobre o tempo de mandato dos Prefeitos, Vice-Prefeitos e Vereadores e sobre as eleições para esses cargos no dia 30 de novembro de 1969; extingue a Justiça da Paz eletiva; exclui da apreciação judicial atos praticados de acordo com suas normas e Atos Complementares decorrentes.
Dispõe sobre as consequências da suspensão dos direitos políticos e da cassação dos mandatos eletivos federais, estaduais e municipais; e dá outras providências.
Dá nova redação ao artigo 157 da Constituição Federal de 1967, que dispõe sobre desapropriação de imóveis e territórios rurais.
Atribui competência para realizar Reforma Administrativa ao Poder Executivo dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios de população superior a duzentos mil habitantes; e dá outras providências.
Estabelece normas sobre remuneração de Deputados Estaduais e Vereadores; dispõe sobre casos de vacância de cargos de Prefeito e Vice-Prefeito; suspende quaisquer eleições parciais para cargos executivos ou legislativos da União, dos Estados, dos Territórios e dos Municípios; exclui da apreciação judicial atos praticados de acordo com suas normas e Atos Complementares decorrentes; e dá outras providências.
Dá nova redação aos artigos 113, 114 e 122 da Constituição Federal de 1967; ratifica as Emendas Constitucionais feitas por Atos Complementares subsequentes ao Ato Institucional nº 5; exclui da apreciação judicial atos praticados de acordo com suas normas e Atos Complementares decorrentes; e dá outras providências.
Suspende a garantia do habeas corpus para determinados crimes; dispõe sobre os poderes do Presidente da República de decretar: estado de sítio, nos casos previstos na Constituição Federal de 1967; intervenção federal, sem os limites constitucionais; suspensão de direitos políticos e restrição ao exercício de qualquer direito público ou privado; cassação de mandatos eletivos; recesso do Congresso Nacional, das Assembléias Legislativas e das Câmaras de Vereadores; exclui da apreciação judicial atos praticados de acordo com suas normas e Atos Complementares decorrentes; e dá outras providências.
Convoca o Congresso Nacional para discussão, votação e promulgação do Projeto de Constituição apresentado pelo Presidente da República e dá outras providências.
Dispõe sobre eleições indiretas nacionais, estaduais e municipais; permite que Senadores e Deputados Federais ou Estaduais, com prévia licença, exerçam o cargo de Prefeito de capital de Estado; exclui da apreciação judicial atos praticados de acordo com suas normas e Atos Complementares decorrentes.
Modifica a Constituição do Brasil de 1946 quanto ao processo legislativo, às eleições, aos poderes do Presidente da República, à organização dos três Poderes; suspende garantias de vitaliciedade, inamovibilidade, estabilidade e a de exercício em funções por tempo certo; exclui da apreciação judicial atos praticados de acordo com suas normas e Atos Complementares decorrentes; e dá outras providências.
Modifica a Constituição do Brasil de 1946 quanto à eleição, ao mandato e aos poderes do Presidente da República; confere aos Comandantes-em-chefe das Forças Armadas o poder de suspender direitos políticos e cassar mandatos legislativos, excluída a apreciação judicial desses atos; e dá outras providências.


Enfim, senhores, repetiria a passagem da Bíblia, o livro sagrado dos cristãos: "Quem de vocês não tiver pecado, atire nela [a mulher pega em adultério] a primeira pedra"Jo. 8,1-11.


Não obliteremos todos os atos de patifaria que ardilosamente os homens armam uns contra os outros no intuito de alcançarem uma posição privilegiada. Justiça é o que queremos, porém, saibam todos: o homem é justo tanto quanto um homem pode ser. Acredito nos homens, afinal, por trás de tudo o que passamos, não há ator principal, senão o homem. Querer negar a natureza primeira do homem é transformá-lo em algo degenerado, pois é isso que fazemos quando impomos aos nossos jovens padrões de uma moral. Quanto mais rígida, mais díspar do âmago do ser do homem. Nenhum homem, meus senhores, recebeu de nenhum Deus ou da Natureza ou de seu semelhante o direito de governar a vontade do outro. E, se pensam diferente, saibam que o seu semelhante pode ser, e é, tão igual a você quanto se pode comparar dois metros.



Para que não pairem dúvidas sobre as mazelas do sistema que hoje vigora, creio que contribui um pouco na amplitude da visão adestrada de alguns ou pelo menos apresentei outros pontos para se pensar. No entanto, creio que queiramos trilhar outros caminhos que não apenas os dois aqui mencionados. Para tanto, acredito que cada homem está disposto a sacrificar um pouco em benefício da coletividade.



Finalmente, gostaria de deixá-los com a seguinte questão: somos todos responsáveis por cada alma que vive à mercê do atual sistema; subsistindo como animais ao relento, encarados como seres inexpressivos e um peso morto para a humanidade. Qual tribunal julgar-se-ia a si mesmo?



Escrito por Joandre Oliveira Melo
Pará de Minas, nove de novembro de 2014.

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